"EXERCÍCIO DE SUICÍDIO"
DE NERI LIMA
Direção: Natan Duarte
SINOPSE
Exercício de Suicídio (revela ao espectador o seu maior medo: a morte). O medo da morte é tão veemente, que os personagens passam a desejá-la, numa nítida tentativa de controlar o destino e não de ser escravo dele.
Escolher morrer, ter o domínio e não morrer por conseqüência de ser vivo. Conta a história de um suicida que, incapaz de se matar, procura alguém para fazê-lo. No entanto, seu escolhido não concretiza a façanha e uma terceira pessoa se faz necessária. Presos, os três conflituam-se num duelo de idéias, argumentos e atitudes, onde a coragem, o medo e a verdade são postos à prova
Esta é uma obra com características que se assemelham ao teatro do absurdo, onde dois personagens passam a conviver, presos um ao outro, trancados entre quatro paredes e como reflexo, se completam. A história começa quando Antônio seqüestra Eugênio no intuito de que se torne seu assassino. Através de uma admirável eloqüência, este personagem confunde o marinheiro seqüestrado, até que este o agride com um remo, cegando-o. Neste ponto, Eugênio deixa de ser vítima e passa a ser carrasco.
Preso a culpa, Eugênio passa a ser os "olhos" de Antônio, penetrando de uma vez por todas em seu mundo obscuro. Eugênio se vê prisioneiro de uma prisão sem muros, até que, em busca de liberdade, os personagens decidem contratar um Matador de aluguel.
Foi escrita em 1989, rescrita diversas vezes, sendo a última data de 02 de junho de 2005. Segundo o autor, as diversas versões desta obra se devem ao seu desejo de torná-la mais dinâmica, diminuindo a introspecção dos personagens e gerando um rítmo mais intenso nos diálogos. A montagem atual é a versão original.
Tal obra é composta por dois atos, com dois distintos ambientes. O primeiro, um barco à deriva; o segundo, o interior de uma casa. Nesta montagem, toda a obra se passa no interior de uma casa, estando esta perdida em alto mar.
A escolha da peça se deve a imensa vontade que tenho de encená-la desde que a li, em 1999. Esta é uma obra que me atrai no tema e na maneira de como ele é tratado. Néri Lima mescla psicologia e poesia, num enriquecido discurso sobre a morte iminente, o tempo devassador, o medo da velhice e a coragem do suicídio.
"Heróis da sua própria covardia...é assim que deve ser desenhado o esboço dos personagens, já que eles vivem num mundo dúbio. São reféns de si mesmos e vivem a insultar a sua própria existência, por considerá-la um fardo. Eles tentam o equilíbrio entre o silêncio e as pausas, mas é o grito que os mantêm vivos, numa ambigüidade que os torna singular. Não gritam, mas têm no grito a esperança, como se esta fosse uma caixa de surpresa".
O retrato cruel deste universo sombrio pode parecer ilógico, mas está coerente com a necessidade de cada personagem ser abissal, não apenas maquiado pelo imediatismo do aqui e agora, mas pela reflexão de um mundo cada vez mais fragmentado e individualista. O mundo do "eu"e "nós".
Para eles o amanhã está morto e a existência é apenas um duelo entre a vida e a morte; um exercício inútil de sobrevivência, no intuito de levar o tempo ao podium" (Néri Lima).
Em geral esses personagens parecem ser a extensão de um só; o controle e o descontrole; a calma e a impaciência; o calculismo e o impulso; a loucura e a sanidade...
Parece ser um dúbio pensamento; um sempre pondo em cheque o argumento do outro. Eles se completam, necessitam-se para continuarem existindo.
MATERIAL DE CENA E SEU SIMBOLISMO
O Mar
O mar é uma imagem usada como poderoso objeto de exploração cênica. Trás em si a metáfora do infinito, do desconhecido, assim como é a mente humana, com suas variáveis. A variação das marés e a variação do temperamento. Estar perdido em alto mar não é mais do estar perdido em si mesmo. E assim estão os personagens, em busca de um porto seguro.
O Revólver
Para Antônio uma arma não passa de uma maneira rápida e sem dor de morrer. Para o matador a arma aparece como objeto de poder, usado mais como escudo do que para agredir. O Matador na verdade é um "covarde" e pensa que deixará de sê-lo, ou deixarão de pensar que ele é, caso ele possua tal objeto. Mas o texto deixa claro que os objetos por si só não são nada. Eles dependem de quem o manuseia para terem sentido. Nas mãos de Antônio é um objeto inútil. Nas do matador, um objeto de suicídio. Nas mãos de Eugênio, um objeto de homicídio.
As paredes
Os personagens sempre fazem alusão às quatro paredes que aprisionam as pessoas. Uma sala sem saída, onde não se sabe nitidamente como as pessoas puderam entrar. O que se sabe é que só após a morte estarão livres. Assim, as paredes ganham a conotação de corpo humano e suas limitações. Adentrando mais, pode-se dizer que as paredes são uma metáfora da mente humana como uma prisão a qual todos nós estamos condicionados, nos medos, desejos e falta de controle.
O Remo
O remo é o objeto guia de uma pequena embarcação. Sem ele os tripulantes de um barco estariam à deriva. Assim, na sua utilização, o remo é a detenção do poder. Com ele se decide para onde ir, mesmo contra a maré. No entanto, é com ele que Eugênio cega Antônio. Nitidamente percebe-se a metáfora de que o pode cegar. Quem detém o poder, detêm o destino. Mas o poder por si só tem a capacidade de subjugar seu detentor, fazendo dele seu prisioneiro. É o que ocorre com Eugênio, ao agredir Antônio.
O Livro
A leitura é algo muito íntimo, geralmente feito em solidão. Antônio possui um romance que também fala de morte, de corpos insepultos....este livro, lido ao final da peça por Eugênio, provoca seu desfecho. É mais um recurso que aponta para o alto intelecto de Antônio, e o fato de Eugênio estar aprendendo com ele, como um pupilo sendo instruído, para que depois tome o lugar do mestre.
O vinho
O vinho é um objeto ligado aos ritos e carregado de erotismo. Aponta para um Antônio refinado e com libido ativa, apesar de não haver alusão ao sexo na obra.
O Espelho
O espelho revela a nós quem somos, mas numa outra perspectiva; nosso reflexo é o avesso de nós mesmos. Assim, o espelho adquire particularidades importantes nesta obra. Ele acusa o envelhecimento e demonstra a passagem do tempo. Na encarnação, Antônio, mesmo após cego, mira-se ao espelho, e este gesto provoca a tragédia de sua morte. Não há o reconhecimento entre a imagem e o reflexo. Os personagens, mesmo não querendo encarar o tempo, mantêm um espelho na sala, como que se cumprissem penitência, sempre sendo violentados por eles mesmos.
FICHA TÉCNICA
- Direção: Natan Duarte.
- Elenco:
- AC Costa - Como Antônio
- André Nunes - Como Matador
- Paulo Prazeres - Como Eugênia
- Maquiagem: Iasmine Menezes
- Iluminação: Maris Carla Santos
- Figuração: Célia Brito
- Produção: José Domingues
QUANDO:
- 25/11 A 18/12
- SEXTA-FEIRA, SÁBADO 21;00 HORAS
- DOMINGO 20\;00 HORAS
- TEATRO GAMBOA
- VALOR: R$ 14,00(inteira) R$ 7,00 (meia).
